segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Babel (2006)

Um casal americano com problemas conjugais, Richard (Brad Pitt) e Susan (Cate Blanchett), vê as suas férias em Marrocos serem abaladas quando Susan é alvejada no autocarro onde viajam. Yussef (Boubker Ait El Caid) e Ahmed (Said Tarchani), filhos de um pobre pastor marroquino, brincam com a espingarda que o pai acabou de comprar para matar chacais. Amelia (Adriana Barraza), a ama de Mike (Nathan Gamble) e Debbie (Elle Fanning), filhos de Richard e Susan, não consegue arranjar ninguém que tome conta deles, e decide levá-los consigo e com o seu sobrinho Santiago (Gael García Bernal) ao casamento do seu filho no México. Tudo corre bem até que, no regresso, são inspeccionados pela zelosa polícia fronteiriça. Chieko (Rinko Kikuchi) é uma adolescente japonesa surda em pleno despertar sexual que direcciona a sua raiva contra o pai, Yasujiro (Kôji Yakusho), de quem se sente afastada desde a morte da sua mãe.

À semelhança dos seus anteriores filmes da equipa Guillermo Arriaga e Alejandro González Iñárritu, argumentista e realizador respectivamente, “Amores Perros” (2000) e “21 Grams” (2003), também “Babel” é tecido com várias narrativas que se interligam. Cada uma delas contém em si mesma um tremendo peso e profundidade, o que torna o resultado global emocionalmente avassalador. O novelo é tecido com mestria, a tensão é acumulada e libertada nos momentos adequados e, apesar dos saltos temporais e espaciais, “Babel” nunca se torna confuso, ao contrário do que se poderia esperar de um filme com este título.

Babel” faz um retrato duro e incisivo sobre a comunicação no mundo actual, ou melhor, a falta dela. Mas Guillermo Arriaga e Alejandro González Iñárritu não se limitam a evidenciar diferenças culturais. Os “idiomas” que “Babel” põe em causa vão desde o político (a Embaixada Americana mostra-se mais interessada em acusar terroristas e publicitar o incidente nos noticiários do que a enviar uma ambulância para socorrer Susan); até ao pessoal, quando dois indivíduos que falam a mesma língua e partilham uma vida em comum se comportam como estranhos. Pelo caminho passa-se por todo um conjunto de malentendidos e preconceitos, Iñárritu coloca-nos, sem misericórdia, perante uma revoltante realidade.

Mas mostra-nos também a possibilidade de luz, na força que a empatia tem de derrubar barreiras que parecem intransponíveis. Os momentos mais tocantes de “Babel” são os instantes em que, de facto, os seres humanos atravessam essa ponte que os separa do outro: quando Amelia fala com Mike e Debbie em espanhol e eles, entendendo-a, lhe respondem em inglês; quando, a um nível humanamente básico de entendimento, uma idosa acalma a dor de Susan; quando Chieko transmite toda a sua vulnerabilidade a um estranho; ou quando Richard e Susan se reencontram no limite da fragilidade. Infelizmente, parece que o sofrimento é a única forma de fazer com que o ser humano se veja reflectido no outro.

Babel” está cheio de boas interpretações, habilmente doseadas em termos de celebridade e equilibradas em termos de tempo de ecrã. Brad Pitt tem uma das suas melhores interpretações, como um homem que fugiu à tragédia no seu passado, mas que desta vez está firmemente decidido a ficar e lutar. Adriana Barraza é fabulosa e desconcertante, e Rinko Kikuchi, limitada à expressão facial e corporal, é especialmente impressionante.

Babel” é um filme trágico e belo, que exige ao espectador, de uma forma quase contínua, a digestão de dramas humanos que, exactamente por serem de outros, nos pertencem a todos. Mas conseguir ler neste filme a esperança (a generosidade de que o Homem é capaz para com o seu semelhante) é a tarefa mais complicada. Quem o consiga, terá aqui uma experiência cinematográfica verdadeiramente gratificante.

Temos todas as capacidades de chegarmos uns aos outros, e teimamos em fechar-nos no nosso mundo, falsamente controlado e falsamente limitado. Não é Deus que castiga o Homem. É ele que se inflige a si próprio este castigo, insistindo num comportamento altamente destrutivo, recusando-se a escutar, a entender, a tolerar o outro, que é, no fundo, ele próprio. 8/10

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